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Breve evolução histórica do seguro de acidentes do trabalho no Brasil

A primeira norma jurídica a regular as obrigações resultantes dos acidentes do trabalho no Brasil foi o Decreto n. 3.724/19, editado durante a Primeira República Brasileira, também conhecida como República Velha (1889 – 1930). Até então, a responsabilidade por acidentes do trabalho era regida pela legislação civil da época, vigente desde 1º de janeiro de 1917.

O Decreto n. 3.724/19, em seu artigo, 2º, determinou que o acidente, quando ocorrido pelo trabalho ou durante este, obrigaria o empregador a pagar uma indenização ao empregado ou à sua família, excetuados apenas os casos de força maior, dolo da própria vítima ou de estranhos:

Art. 2º O accidente, nas condições do artigo anterior, quando occorrido pelo facto do trabalho ou durante este, obriga o patrão a pagar uma indemnização ao operario ou á sua familia, exceptuados apenas os casos de força maior ou dolo da propria victima ou de estranhos.

O referido Decreto representou o abandono definitivo da teoria aquiliana, baseada na culpa como pressuposto à obrigação de o empregador indenizar acidentes sofridos pelos empregados, dando lugar à teoria do risco profissional.

O Decreto-Lei n. 24.637/34 e o Decreto-Lei n. 7.036/44, que se sucederam ao Decreto n. 3.724/19, encamparam, até 1967, a teoria do risco profissional. O primeiro obrigou os empregadores a contratarem seguro contra acidentes, cobrindo todos os riscos relativos às várias atividades, facultando-lhes, porém, a realização de depósito prévio a fim de se eximirem da obrigação:
Art. 36 Para garantir a execução da presente lei, os empregadores sujeitos ao seu regime, que não mantiverem contrato de seguro contra acidentes, cobrindo todos os riscos relativos às várias atividades, ficam obrigados a fazer um depósito, nas repartições arrecadadoras federais, nas Caixas Econômicas da União, ou no Banco do Brasil, em moeda corrente ou em títulos da dívida pública federal, na proporção de 20:000$000 (vinte contos de réis), para cada grupo de 50 (cincoenta) empregados ou fração, até ao máximo de 200:000$000 (duzentos contos de réis), podendo a importância do depósito, a juízo das autoridades competentes, ser elevada até ao triplo, si se tratar de risco excepcional ou coletivamente perigoso.
A garantia de indenização deveria se dar, portanto, por meio de contratos de seguro de acidentes do trabalho ou depósitos bancários em garantia. Tratava-se de uma espécie de “sistema de autosseguro”, indenização sob responsabilidade direta do empregador.

Em 1944, no final do Estado Novo, o Decreto n. 7.036/44 aperfeiçoa a teoria do risco profissional, incluindo os trabalhadores na agricultura e comércio, com base na condição de subordinação do empregado, e não somente na ideia de perigo da atividade industrial.

Com o Decreto-lei n. 7.036/44, extingue-se a possibilidade de autosseguro, tornando obrigatória a contratação de seguro, a ser realizado na instituição de previdência social a que estiver filiado o empregado (artigo 95), com as entidades seguradoras então existentes (artigo 111), as quais competiriam a cobertura destes riscos.

Posteriormente, o Decreto n. 293/67 consolidava e confirmada o atendimento privado do seguro de acidentes do trabalho, com a concorrência entre as seguradoras privadas e o recém-criado Instituto Nacional de Previdência Social. A Lei n. 5.316, também editada em 1967, integrou totalmente o seguro contra acidentes do trabalho no INPS, retirando-o das seguradoras privadas.

Assim, a indenização infortunística passou a responsabilidade estatal, com benefícios de prestação continuada, além dos pecúlios por invalidez ou morte.

A Constituição de 1969 integrou o acidente do trabalho à Previdência Social, dispondo em seu artigo 164, inciso XVI, “Previdência social nos casos de doença, velhice, invalidez, morte, seguro de desemprego, seguro contra acidente do trabalho e proteção à maternidade, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado”.

Em 1976, a Lei n. 6.367, editada sob a já consolidada inclusão do seguro de acidentes do trabalho no sistema previdenciário, segue a teoria do risco profissional, ainda que com maior tendência à Teoria do Risco Social, mantém a contribuição adicional, a cargo do empregador, para custeio do benefícios decorrentes do acidente do trabalho, restringindo, contudo, a cobertura das doenças profissionais e do trabalho, equiparando apenas as “constantes da listagem organizada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social”.

A Constituição Federal de 1988 manteve o segurado de acidentes do trabalho fundamentado na teoria do risco profissional, conforme enuncia o seu artigo 7º, inciso XXVIII: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregado, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”.

O enunciado constitucional modela uma típica relação securitária, atribuindo ao empregador a condição de patrocinador (prêmio), ao acidente do trabalho a qualidade de sinistro (dano) e ao empregado o status de beneficiário hipotético da indenização.

A Lei n. 8.212/91, ao tratar das alíquotas destinadas ao custeio dos benefícios decorrentes dos riscos ambientais do trabalho, atende com fidelidade o programa constitucional. Em seu artigo 22, inciso II, impõe contribuição, a cargo do empregador, à alíquota de 1%, 2% e 3%, de acordo com o grau de risco de acidentes do trabalho, se leve, médio ou grave, respectivamente.

O risco, nesta acepção, se orienta a partir de um evento futuro e incerto, de modo que os seguros baseados no risco não se centram numa necessidade presente, mas numa determinada possibilidade. O risco coberto por um seguro combina duas variáveis: probabilidade e dano.

O dano se decompõe em três fatores: i) valor; ii) tempo; e iii) espaço. O tempo se relaciona com o custo do dano, vinculando o valor à temporariedade da contingência. Quanto mais tempo durar a contingência, maior será o valor do dano.

Neste sentido, a definição da alíquota destinada à subscrição dos riscos ambientais do trabalho deve ser proporcional à probabilidade de dano potencial, gerada pela atividade econômica preponderante do estabelecimento – assim considerada aquela atividade que ocupa a maior quantidade de empregados e trabalhadores avulsos.

Com efeito, o Poder Executivonão se desincumbiu do ônus de comprovar que as alíquotas (prêmios) destinadas ao custeio dos benefícios decorrentes dos riscos ambientais do trabalho – isto é, aqueles riscos profissionais ordinários e indissociáveis do trabalho -, dimensionadas no Anexo V do Decreto n. 3.048/99, são coerentes, sob a ótica estatística, financeira e atuarial, à probabilidade de dano proveniente das atividades econômicas, fragilizando sobremodo a natureza securitária do modelo vigente.

Por Leandro Lamussi.

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